domingo, 7 de novembro de 2004

Depois de perder um Sul-Americano até para as frágeis argentinas, CBB cancela competições que revelam talentos

Em baixa, Brasil despreza aposta na base

ADALBERTO LEISTER FILHO
DA REPORTAGEM LOCAL


Em um ano em que a seleção feminina viu sua hegemonia sul-americana nas categorias de base entrar em xeque, a Confederação Brasileira de Basquete cancelou dois torneios importantes para a formação de novas jogadoras.
Em nota oficial datada de segunda-feira, que passou quase despercebida por ser a véspera do feriado de finados, o presidente da CBB, Gerasime Bozikis, o Grego, anunciou que não haverá os Brasileiros infanto e juvenil.
Segundo o comunicado, isso se deve à "falta de federação interessada em sediar os campeonatos". De acordo com a CBB, a entidade por duas vezes convidou os Estados a abrigar as competições, mas ninguém se propôs a sediá-las.
Toni Chakmati, presidente da federação paulista, tem outra versão. "São Paulo queria ficar com o Brasileiro juvenil. Pegaríamos o torneio e depois veríamos em que cidade colocar. Mas houve o pedido de Curitiba. Como as competições sempre são aqui, abri mão. Depois o Paraná desistiu. Aí não interessava mais", diz o dirigente.
A decisão repercutiu mal entre os técnicos dos principais times.
"Não é legal abrir mão de um torneio desses. O feminino é carente desse tipo de disputa", diz Paulo Bassul, que dirige o Americana, atual campeão nacional.
"Acho que a realização de torneios de base havia sido um dos méritos da gestão do Grego na CBB. É lamentável", completa.
Em muitos Estados que não contam com torneios fortes, a disputa do Brasileiro é a chance de novas atletas aparecerem para os clubes dos principais centros. "As categorias de formação são a base de tudo. Sem elas não há renovação", aponta Antonio Carlos Vendramini, técnico do Ourinhos.
Neste ano, o Brasil não teve motivos para se dar ao luxo de desprezar os torneios de base. O país manteve a supremacia só no Sul-Americano juvenil. Mas, na Copa América, a seleção ficou em quarto, atrás até de Porto Rico, que nunca foi potência no feminino. A colocação deixou as brasileiras fora do Mundial da categoria.
Não bastasse isso, veio a suprema humilhação: o time nacional foi derrotado no Sul-Americano cadete pela arqui-rival Argentina.
Procurado pela Folha, Grego informou, por sua assessoria de imprensa, que a CBB banca várias despesas desses torneios, como viagem das delegações, taxa de arbitragem e troféus. Mas é necessário que haja uma cidade interessada no evento. Segundo ele, sua gestão promoveu 114 Brasileiros de base (masculino e feminino).

Revelação tardia assombra com enterradas


DO ENVIADO A OURINHOS

Tudo começou com uma brincadeira em um treino do time de veteranos de Goiânia, em março.
Jóia, ala que como profissional passou por Volta Redonda (RJ), Jacareí (SP) e Jóquei Clube (GO), entre outros clubes, quis mostrar para uns garotos, que participavam do rachão, que era o único capaz de enterrar a bola na cesta.
Não satisfeito, quis humilhá-los.
"Agora é a sua vez, Isis", berrou para a filha, 21, que assistia toda a disputa à beira da quadra.
A jovem usou os passos aprendidos no vôlei -esporte que jogou até chegar à faculdade- para correr até o garrafão. Subiu... E enterrou. "Não esperava que fosse conseguir", confessa a pivô.
Todos ficaram boquiabertos. Era a primeira brasileira, que se tem notícia, a atingir o feito. E em tentativa despretensiosa. "Os garotos vieram me dar parabéns", conta sorridente a espigada pivô.
Não demorou muito para o fenômeno ser descoberto por São Paulo. Em setembro já estava defendendo Barretos nos Jogos Abertos do Interior. "Uma técnica, amiga de meu pai, conhecia o pessoal de lá, que precisava de uma pivô. Ela me indicou."
Há três semanas está no Ourinhos, que venceu o torneio de basquete dos Jogos Abertos.
"Conheci a Isis quando ela jogava no Rexona [time de vôlei] e eu dirigia o Paraná", lembra Antonio Carlos Vendramini, hoje técnico do Ourinhos, referindo-se ao extinto time paranaense, campeão nacional de basquete em 2000.
Pois é, Isis apostou seu futuro pulando sobre a rede. Teve passagens por clubes com bom trabalho de base, como Rexona e Osasco, mas não se firmou no esporte.
"Comecei a jogar vôlei com 14 anos. No ano seguinte fui treinar em Curitiba, no time do Bernardinho. Era nova. Fiquei deslumbrada. Não deu certo", conta ela, que abriu mão da carreira esportiva para cursar administração.
A distância das quadras não durou muito. Dois anos depois de encerrar sua paixão pela rede, engatou namoro com a cesta. O novo romance a fascina tal qual à menina de 15 anos que um dia tentou a sorte em Curitiba.
"Estava no banco, e o Vendramini falou para eu entrar. Achei que era brincadeira. Nem acreditava que estava jogando", conta, referindo-se aos parcos 36 segundos que ficou em quadra na vitória sobre o São Paulo-Guaru, pela segunda rodada do Nacional.
Fascinada com a chance, fez um toco e caiu algumas vezes antes de voltar ao banco. "O jogo estava fácil, por isso a coloquei", diz Vendramini. "A Isis não tem muito equilíbrio. Ela precisa fortalecer a musculatura e pegar mais fundamento. Mas, pela minha experiência, acho que pode ser uma boa jogadora", analisa o técnico.
A pouca impulsão para colocar a bola na cesta impressiona até colegas bem mais experientes.
"Ela quase não sai do chão para enterrar", espanta-se Lisdeivi Victores, 30, que jogou duas Olimpíadas e três Mundiais e fugiu de Cuba para pedir asilo no Brasil.
De fato, a enterrada quase só acontece no masculino. Normalmente, as mulheres não conseguem erguer os braços a 3,05 m do chão -a altura da cesta-, em uma das jogadas plasticamente mais bonitas do basquete.
Que se tem notícia, a primeira pivô a enterrar foi Georgeann Wells, da Universidade da Virgínia Ocidental. O feito aconteceu em 21 de dezembro de 1984. Na WNBA, a pioneira foi Lisa Leslie, do Los Angeles Sparks, em jogo contra o Miami Sol, há dois anos.
"Imagine a Isis fazendo isso no Nacional. A torcida iria ao delírio", vislumbra Vendramini.
Para isso, o técnico conta com o trunfo de Lisdeivi. A cubana chega todos os dias meia hora mais cedo aos treinos para orientar Isis e Luciane, 22, outra pivô recentemente incorporada à equipe.
"Quando a Isis chegou, não sabia nem arremessar. Estou ensinando os movimentos de pivô para ela. Não sei se vai dar certo. Depende mais dela", diz Lisdeivi.
O curso intensivo de basquete também é ministrado pela própria família. "Meu pai me dá muitas dicas. Falo com ele quase todos os dias. É de quem mais sinto falta", suspira Isis, que é prima do pivô Marcionílio. Seu irmão, Pedro Henrique, 18, treina no juvenil do Ribeirão Preto.(ALF)

"Meu pai falou que eu conseguiria. Mesmo assim, todos ficaram maravilhados na hora"
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ISIS
sobre sua primeira enterrada


Fonte: Folha de São Paulo



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