Maurício Dehò
Em São Paulo (SP)Dois países de dimensão continental, com poucos times em seus campeonatos principais e dificuldades de encontrarem rivais nos países mais próximos. Assim são Brasil e Austrália no basquete feminino. Mas as semelhanças param por aí. Enquanto as australianas são campeãs mundiais e vice-olímpicas, as brasileiras sofreram para chegar a Pequim, e nem passaram da primeira fase na China.
Para mudar isso, o técnico Paulo Bassul estuda uma renovação na seleção e tem como principal espelho justamente a estrutura australiana. A principal ideia do projeto é formar dois times. Além da seleção principal, haveria um outro grupo, mais jovem, que passaria a fazer torneios no exterior, adicionando bagagem ao currículo das jogadoras.
"A Austrália é campeã mundial e roda o mundo com uma seleção muito nova", explicou Bassul sobre o "time B", ao UOL Esporte. "Elas conseguiram um núcleo de jogadoras muito forte e, pela semelhança nas dificuldades que enfrentam, mostraram que é possível colocar o Brasil na luta."
A idéia central do projeto de Bassul é fazer com que a seleção adulta passe a ter mais opções para compor o grupo. "Precisamos amadurecer as jogadoras mais jovens", adicionou. "Estamos numa entressafra. O que aconteceu foi que na saída da geração de Janeth, Helen e Alessandra ficou um buraco, as jogadoras vieram com pouca experiência internacional. Por isso foi uma dificuldade grande classificar-nos para as Olimpíadas."
O treinador encara o novo ciclo olímpico como um recomeço. "Meu trabalho começa agora". Ele alega que em apenas um ano teve pouco tempo para preparar o time para as Olimpíadas e, para garantir a classificação, montou um plantel diferente do que gostaria de ter usado.
A primeira experiência do renovado time adulto será apenas em setembro, com a Copa América, em Cuiabá. O Brasil lutará pelo título e tentará obter uma vaga no Mundial. Para a competição, Bassul não cita nomes, mas já diz ter na cabeça as atletas que seguirão como base na seleção e os novos talentos de 17 a 22 anos que devem aparecer, em aposta semelhante à que já fez.
"Será uma equipe mesclada. Nós lançamos a Franciele e foi um grande acerto, então há outras jovens que darão conta do recado", garante. "Não adianta vivermos de Paula, Hortência e Janeth, temos de fazer novas apostas."
Planos atrasadosUm dos maiores empecilhos para o início do projeto é político. Paulo Bassul acredita que o fato de as eleições na CBB ocorrerem em maio de 2009 não permitirão uma implantação breve da segunda equipe. Assim, as primeiras experiências são esperadas para o meio do ano, antes de o time adulto se reunir para a Copa América.
Procurada pelo UOL Esporte, a confederação não comentou um prazo para o desenvolvimento do trabalho, nem confirmou se ele será colocado em prática.
Demitido do Ourinhos justamente por dividir suas atenções com a seleção, Bassul atualmente dedica-se apenas à equipe adulta do Brasil e a projetos pessoais. Como fez há dez anos, em Americana, ele quer abrir um novo trabalho, que pode virar mais um time no basquete nacional. "Eu não quero tirar o espaço de ninguém. Minha idéia é abrir novas oportunidades no Brasil."
Bassul admite que não é possível sobreviver apenas como técnico do Brasil. "É um meio muito restrito, mas agora estou com a cabeça de resolver não só o meu problema, contribuindo para o basquete feminino. Estou com um novo projeto e vamos ver se conseguimos tocá-lo."
Especialistas apóiam ideia de 'time B' na seleção de basquete
O projeto do técnico Paulo Bassul de colocar em prática um time B na seleção brasileira de basquete feminino tem ganhado apoio para que seja colocado em prática. O objetivo é ter uma equipe com jogadoras mais jovens e que tenham possibilidade de conseguir maior experiência internacional, chegando à seleção com maior maturidade.
ESPECIALISTAS APÓIAM PROJETO A reportagem do UOL Esporte entrou em contato com pessoas ligadas ao basquete feminino e a ideia, que se assemelha ao que é feito pela seleção australiana de basquete, campeã mundial, foi elogiada.
A técnica Branca Gonçalves, que atualmente está à frente do time de Americana, explicou que o Brasil precisa diminuir sua diferença em relação às seleções estrangeiras. Ela lembrou de uma seleção sub-21 que jogou como um clube, durante o Nacional, e apoiou o desenvolvimento do trabalho.
"Na verdade, demorou para termos algo neste estilo. Era para o Brasil ir para o Sul-Americano com uma equipe B, porque só com gabarito internacional poderemos evitar esse choque que acontece na troca de gerações", afirmou Branca, referindo-se às dificuldades após a saída de estrelas como Janeth, Helen e Alessandra, nos últimos anos.
"Sou de acordo até para ele (Paulo Bassul) atuar. Acho um crime ele ficar parado", afirmou ela, que também lamentou ao dizer que o basquete feminino "é sempre um drama."
Já a armadora Natália Burian, de 24 anos e uma das jogadoras que pode estar nas próximas convocações de Bassul, foi favorecida com uma iniciativa semelhante. Em 2008, sem poder contar com estrelas como Iziane, a seleção convocou jogadoras mais jovens para o Sul-Americano.
Na ocasião, ela fez sua primeira competição oficial com a equipe, no Equador. "Isso foi o que me salvou. Foi aí que surgiu a oportunidade do Sul-Americano e do Pré-Olímpico", lembrou ela, que estava na Letônia, no TTT Riga. "Uma iniciativa dessas pode ajudar a revelar jogadoras e, se for permanente, pode ajudar ainda mais. As mais novas não terão aquele medo de ir para a seleção."
Presente nas maiores conquistas do basquete feminino, Hortência lembra que a ideia não é inovadora. "Não tem nada de novo nisso, mas é algo essencial", afirmou ela. "O essencial é botar a molecada para jogar, para quando elas chegarem às competições internacionais, já se conhecerem."
Por ser um esporte coletivo, diz Hortência, não é possível apenas reunir as jogadoras um mês antes das competições e esperar um nível alto de jogo. Assim, é importante sentar com clubes nacionais e estrangeiros para agendar períodos de treinamento durante o ano, assim como a realização de um maior número de amistosos.
"Sempre ouvimos que o Brasil fica longe da Europa, que falta dinheiro... A conversa sempre é essa. Temos de botar o infantil, o juvenil, o sub-20 para jogarem. Quando chegarem para representar o Brasil, já terão experiência", concluiu Hortência, campeã do Mundial de 1994 com o Brasil.
Fonte: UOL