quinta-feira, 2 de outubro de 2008

Entrevista - Adriana Santos (CBB)


O Campeonato Nacional Feminino de 2008 terá um brilho a mais. A ala Adriana Santos, dona de um dos currículos mais recheados de títulos do basquete brasileiro, aceitou o convite para reforçar o time de Americana (SP) e estreará no dia 7 de outubro, jogando contra Ourinhos. Aos 37 anos, a jogadora diz que está difícil se despedir do basquete e que, como os vinhos franceses, sente-se melhor com o passar do tempo. Sorte do Brasil. Após sete anos defendendo grandes equipes na França e na Espanha, Adriana está de volta e trouxe a família. Quando não está nas quadras treinando, a atleta assume o papel de mãe da pequena Luiza, de um ano e três meses. Medalha de ouro nos Jogos Pan-Americanos de Havana (1991) e no Campeonato Mundial da Austrália (1994) e medalha de prata na Olimpíada de Atlanta (1996) e bronze em Sydney (2000), ela agora segue em busca do título de campeã brasileira, um dos poucos que ainda não consta em sua grande e diversificada coleção.


Como está a preparação da equipe de Americana para o Nacional Feminino?


O clube foi buscar reforços porque não estava contente com o desempenho no Campeonato Paulista, principalmente por não ter ido às finais. A chegada da técnica Branca e das jogadoras Karla, Karina e a minha são muito importantes porque a meta é essa: chegar na final. Sabemos das dificuldades. Já que em um time montado às vésperas do Campeonato, como o nosso, pode faltar entrosamento. Então, estamos treinando diariamente, em dois turnos e com muita motivação para conquistar esse título, que para mim é inédito e para Americana significa o bicampeonato.

Como é o convívio com as jogadoras mais jovens?


É claro que existe um respeito, até pela questão da idade, porque eu sou a mais velha da equipe. Mas encaramos tudo isso com muita naturalidade. Na hora do treino, isso fica um pouco de lado. Cada uma de nós deve saber o que veio fazer aqui. Eu estou sempre aprendendo. Não considero que já saiba tudo porque sou mais velha. Aprendo tanto com os mais velhos quanto com os mais novos. Penso sempre no coletivo. Tudo que eu já vivi, tento passar da melhor maneira possível. Procuro ser uma boa fonte de conhecimento para as mais novas, mas sempre com companheirismo.

E com a treinadora Branca?


Nós sempre tivemos um bom relacionamento. Vivemos muitas glórias juntas: fomos campeãs paulistas duas vezes e ganhamos a medalha de prata na Olimpíada de Atlanta (1996). Isso criou um clima muito bom entre nós. Como técnica, é a primeira vez que trabalhamos juntas. Estou achando ótimo. Por já ter jogado, ela sabe perfeitamente do que as atletas precisam e entende muito de basquete. A Branca, sem dúvida, veio para somar.

Por que resolveu parar de jogar pela seleção brasileira em 2002?

Eu tinha que optar. Já fiz várias operações no joelho. Estava cansada. Além disso, meu pai estava muito doente e eu queria ter mais tempo para ficar com ele. Jogando em clube e na seleção, não tinha vida privada. Era uma correria o tempo todo. Quando eu vinha para o Brasil, era para treinar pela seleção. Então, achava que meu ciclo na seleção tinha acabado naquele momento, após o Mundial da China, em 2002. A saída foi triste porque, para mim, a seleção brasileira sempre foi um orgulho muito grande. Comecei bem nova, com menos de 20 anos, e ali conquistei os títulos mais importantes do basquete brasileiro feminino. Mas senti necessidade de parar e continuei jogando em clubes. Não sei quando vou parar definitivamente.

Seu estilo de jogo mudou depois de jogar na França?

Sim, em parte. Ganhei muita experiência. Foi importante o contato com uma escola de basquete diferente, que preza muito a defesa. O campeonato deles é fortíssimo e o meu ponto fraco era justamente a defesa. Tive que trabalhar bastante isso porque, na França, quem não sabe defender nem sai do banco. Na verdade, a experiência toda foi importante para mim, inclusive para minha vida pessoal. Morar fora faz a gente amadurecer. Eu aprendi um novo idioma, conheci uma cultura diferente. Tudo é proveitoso. Tive ótima recepção na França. Eles não tinham jogadoras de longa distância e esse era o meu carro-chefe. Eu chutava de três pontos de muito longe. Isso impressionava bastante e acredito que abriu as portas para outras brasileiras que foram jogar lá. Além disso, temos boa conduta, somos jogadoras sérias, e eles dão muito valor a isso, mesmo que a nossa escola de basquete seja diferente.

E o seu jogo hoje, em relação ao início da carreira, é diferente?


Tanto a idade e a maturidade quanto a convivência com a escola francesa de basquete influenciaram a minha maneira de jogar. As jogadoras novas correm muito. Eu percebo isso e sei que também era assim. Hoje, procuro correr na direção certa, o que faz diferença porque não posso me desgastar tanto. Tenho que cuidar do meu corpo. Aos 20 anos de idade, você joga num dia e no outro está perfeita. Agora não é mais assim. Em compensação, depois que eu tive a Luiza, estou menos cansada. Filho dá tanto trabalho que não sobra tempo para sentir dor nem cansaço. Eu brinco que sou igual a vinho francês, que melhora com o tempo.

A família está reunida no Brasil?

Agora, sim. Após o nascimento da Luiza, voltei a jogar na França, num clube da segunda divisão, o Istris. Foi bom para me ajudar a voltar à forma sem ter a cobrança dos times mais fortes. Joguei lá de dezembro de 2007 a abril deste ano. Estou no Brasil desde maio e há um mês em Americana. A Luiza veio comigo da França e meu marido, Virgil, chegou agora porque estava em Pequim, trabalhando na Olimpíada. Pensamos em ficar um pouco no Brasil, pelo menos enquanto a Luiza não inicia a fase de alfabetização. Virgil era preparador físico do Lattes Maurin, minha equipe na França, e quer trabalhar no Brasil, com algum clube. Ele pretende dar aulas aqui também, como fazia na França. Ainda estamos resolvendo isso.

Como consegue manter tão boa forma aos 37 anos e depois da gravidez?

Quando engravidei, engordei 16 quilos. Mas já perdi tudo e agora estou mais magra do que antes da gestação. Além disso, sempre tive boa condição física e nunca fumei nem bebi. Também nunca fui muito de deixar de dormir para ir a baladas e sempre procurei me alimentar bem. Tudo isso faz diferença. É claro que não tenho mais o pique de 10, 15 anos atrás, mas me sinto muito bem. A idade ainda não pesa para mim.

Você pretende seguir a carreira de técnica?


Penso sim em seguir esse caminho. Não sei durante quanto tempo vou continuar jogando, mas quero dar segmento na minha carreira como técnica. Quando eu estava grávida, aproveitei que não podia jogar e fiz um curso para técnicos no Centro de Formação de Atletas em Toulouse, na França. Eles têm uma grande infra-estrutura para os atletas, que moram lá dentro, treinam várias horas por dia e saem para ir à escola. Esse Centro existe em várias cidades da França e abrange diversos esportes. Achei interessante a organização deles e a integração com os clubes, que vão até lá escolher os atletas para formar as equipes. O curso durou seis meses e, no final, fiz prova prática e teórica para uma banca avaliadora. Foi uma experiência importante e enriquecedora para a minha carreira.

Que outros planos você tem para o futuro?

Tenho vontade de implantar um projeto social de basquete no Brasil. A multinacional que patrocinava o meu time na França também está presente no Brasil. Quando ainda estava lá, conversei com eles sobre a minha vontade de fazer um projeto aqui nos moldes desses Centros de Formação da França. A idéia é que tenha desde a escolinha de base até a formação do atleta adulto, e que também tenha ajuda para alimentação, transporte, o que é fundamental no Brasil. Minha expectativa é que o projeto saia do papel no ano que vem. Como a empresa fica em Interlagos (SP), o primeiro núcleo deve ser lá, mas também tenho vontade de realizar esse projeto na minha cidade, que é São Bernardo (SP).

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