quinta-feira, 29 de dezembro de 2005

Faça você mesmo

MELCHIADES FILHO


Alexander Wolff ouviu um dirigente do basquete norte-americano reclamar do crescimento das ligas piratas. Embora não colocassem em risco o negócio, esses campeonatos regionais vacinavam as pequenas cidades contra o glamour da NBA.
O repórter tinha acabado de se mudar para a pacata Vermont de sua infância justamente para se afastar da badalação do esporte e da rotina "trotamundo" do jornalismo esportivo. Mas o espírito de porco falou mais alto.
No início do mês, o premiado colaborador da "Sports Illustrated" fundou o primeiro time profissional de basquete do Estado e pagou US$ 10 mil para incluí-lo em uma dessas ligas paralelas.
Porra-louquice? Longe disso.
Os Frost Heaves nascem com um gasto mensal de US$ 150 mil. Bastará um público modesto de 2.000 pessoas para que lucre.
O segredo é o modelo de gestão, enraizado na comunidade local.
O clube vai disputar um torneio restrito ao Nordeste dos EUA, a fim de explorar rivalidades regionais e otimizar custos de transporte. Usará um ginásio municipal que à noite ficava às moscas.
Todos os parceiros econômicos, da confecção de uniformes ao fabricante de salsichas dos cachorros-quentes, serão de Vermont.
Pelo menos 50% dos jogadores terão obrigatoriamente laços com o Estado, gente que nasceu ou que estudou lá. Mais: a cada partida, um torcedor será sorteado para acompanhar a equipe no vestiário e no banco de reservas.
Por ora, o empreendimento será administrado por um fundo de investidores. Mas já está acertado em contrato que, uma vez atingido o equilíbrio orçamentário, ele passará para o controle dos fãs que comprem o carnê de ingressos para a temporada inteira.
O clube terá, também, um site especial. Todas as partidas serão transmitidas pela internet. Os interessados vão receber por e-mail boletins noticiosos, os "box scores" e um diário de bordo assinado pelo próprio jornalista-cartola.
Quando eu comentei a aventura de Wolff, alguns colegas não resistiram ao chiste e me sugeriram que fizesse algo parecido.
Às vezes, dá mesmo vontade de arregaçar as mangas. Há anos que esta coluna defende um modelo comunitário para reerguer o basquete nacional. E a Nossa Liga acaba de abrir um precedente.
Ok, São Paulo parece cínica demais para outro esporte que não o futebol. Mas não seria ótimo se pudesse voltar a aplaudir o basquete, como aconteceu até a década de 80? O Mundial feminino, marcado para setembro na cidade, podia injetar ânimo. Humm...
O problema é que a minha "comunidade" é a redação deste jornal, e os rachões aqui não costumam acabar bem. O da semana passada terminou com uma vidraça a menos, vítima de um "bullet pass" sem rumo. O do ano retrasado eu terminei no pronto-socorro, com o tríceps dilacerado, após ter sido arremessado por um "pick" mais brusco na direção de um gancho afixado na parede do quintal/quadra (é sério!).
Sei lá, talvez seja melhor, antes de pensar em montar um time, eu começar a procurar uma Vermont menos gelada para mim.

Microempresa 1

Cem pessoas compraram produtos pela internet, cinco cineastas pediram para filmar a primeira temporada e uma fábrica do Egito ofereceu os uniformes. Isso só nos dois primeiros dias dos Frost Heaves.

Microempresa 2

O novo clube de Vermont vai participar da American Basketball Association, que ressurgiu em 2003 com oito divisões. O campeonato do ano que vem contará com 56 times. Entre eles, um de Pequim!

Microempresa 3

Admirador de Paula e Hortência e chapa deste colunista, Wolff sabe que os brasileiros têm mais o que fazer. Ainda assim, convida-os a acompanhar a sua saga pelo www.vermontfrostheaves.com.

E-mail melk@uol.com.br


Fonte: Folha de São Paulo

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