Superpoderoso
Maravilhosa e comovente a coluna de Melchiades Filho, na Folha de hoje.
Deliciem-se.
Passei quase uma semana ao lado de mais de 130 meninas adolescentes que apreciam basquete, um sonho que nem os mais febris momentos da minha puberdade haviam proporcionado.
Meti-me no Ginásio do Ibirapuera, onde, de terça-feira a domingo, 11 times estiveram acantonados para disputar o interclubes nacional juvenil feminino.
Corei quando fui saudado por um salão lotado com "fiu-fius" agudos, gritos de "gostoso" e pedidos para tirar a aliança de casamento. Corei ainda mais quando, uma a uma, as mesmas garotas brincalhonas se despediram com um desmoralizador "tchau, tio".
Olhei para pernas tão belas quanto longilíneas, vi pernas manchadas de roxo. Olhei para dedos esmaltados e sandálias coloridas, vi dedos pretejados por pisões e ataduras de esparadrapo.
Tremi com a mistura de cheiros de xampu. Ouvi muita gente reclamando do aguaceiro do banheiro. Quase escorreguei em poças de suor no acesso à quadra.
De noite, acompanhei esconde-escondes no estacionamento e testemunhei (sem querer!) longos desabafos de saudade no orelhão.
Até levei o Joaquim, 7, para conhecer as gigantes -e para ver se ele, "assustado", pára de atormentar as colegas de classe.
Assisti a uma dezena de jogos, alguns bons. Vi todos os times, alguns muito bons (os de São Paulo), a maioria nas mãos de técnicos que não recebem um tostão.
Impressionei-me com o tato "eu-conheço-a-alma-das-meninas" de Mila Rondon, treinadora de Americana, e com o olhar "atenção-mulheres-trabalhando" de Macau Ferreira, de Osasco.
Gostei dos nomes das jogadoras e rabisquei na agenda: Tersya (Maranhão), Eliene (Americana), Mayara (do campeão Jundiaí), Janaína (Joinville), Daiane (Americana)... E adorei quando, depois, à beira da quadra, notei virtudes técnicas em cada uma.
Em muitas delas, percebi também a chama de confiança/arrogância que o atleta de ponta importa da infância ("pedra, muro e árvore", né, Tersya?). Fiquei com a impressão de que o Brasil terá seleção competitiva, este ano, no Sul-Americano e no torneio qualificatório para o Mundial.
Na arquibancada, partilhei palmas e lamentos dos pais e mestres que organizam vaquinhas a fim de bancar o passe de ônibus, o caderno escolar, o agasalho e o lanche que mantêm a roda girando.
Soube que os EUA, na mesma semana, aplaudiram Candace Parker, 17, que superou cinco rapazes para ganhar o concurso de enterradas do McDonald's All-American Game, um dos três principais jogos intercolegiais do país. (Que ironia. O presidente da CBB quer porque quer achar uma brasileira que estufe a cesta.)
Mas concluí que até os americanos sairiam estupefatos do Ibirapuera, quando constatassem como o talento abençoa o basquete feminino nacional a despeito da falta de estrutura e horizonte.
Fechei o domingo satisfeito com o campeonato e, melhor, feliz por ter encontrado tanta gente que devota à bola laranja um amor tão grande como o meu. Soprei um beijo para as meninas superpoderosas e voltei para casa.
Lindinha
Caçula de uma família basqueteira, Izabela, 17, foi a cestinha (26,2 pontos) e a melhor no ranking de eficiência. Das 132 garotas, a ala do Bauru, 1,82 m, é quem alcança mais alto: 2,88 m, segundo inédito e oportuno estudo antropométrico, tocado pelo médico Daniel Gentil.
Florzinha
Michelle, plácida do alto de 1,93 m, liderou nos tocos: 3,2 por jogo, pelo Joinville. A irmã do festejado Tiago Splitter tem só 14 anos.
Docinho
Com ginga e força nos quadris, a novata pivô do Grajaú alucinou nos rebotes: 22,2 por jogo. Mas Clarissa, 16, gosta de atletismo, esporte em que brilha ainda mais (dardo e peso). A CBB tem de paparicá-la!
E-mail melk@uol.com.br
Fonte: Folha de São Paulo
Maravilhosa e comovente a coluna de Melchiades Filho, na Folha de hoje.
Deliciem-se.
Superpoderosas
MELCHIADES FILHO
EDITOR DE ESPORTE
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MELCHIADES FILHO
EDITOR DE ESPORTE
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Passei quase uma semana ao lado de mais de 130 meninas adolescentes que apreciam basquete, um sonho que nem os mais febris momentos da minha puberdade haviam proporcionado.
Meti-me no Ginásio do Ibirapuera, onde, de terça-feira a domingo, 11 times estiveram acantonados para disputar o interclubes nacional juvenil feminino.
Corei quando fui saudado por um salão lotado com "fiu-fius" agudos, gritos de "gostoso" e pedidos para tirar a aliança de casamento. Corei ainda mais quando, uma a uma, as mesmas garotas brincalhonas se despediram com um desmoralizador "tchau, tio".
Olhei para pernas tão belas quanto longilíneas, vi pernas manchadas de roxo. Olhei para dedos esmaltados e sandálias coloridas, vi dedos pretejados por pisões e ataduras de esparadrapo.
Tremi com a mistura de cheiros de xampu. Ouvi muita gente reclamando do aguaceiro do banheiro. Quase escorreguei em poças de suor no acesso à quadra.
De noite, acompanhei esconde-escondes no estacionamento e testemunhei (sem querer!) longos desabafos de saudade no orelhão.
Até levei o Joaquim, 7, para conhecer as gigantes -e para ver se ele, "assustado", pára de atormentar as colegas de classe.
Assisti a uma dezena de jogos, alguns bons. Vi todos os times, alguns muito bons (os de São Paulo), a maioria nas mãos de técnicos que não recebem um tostão.
Impressionei-me com o tato "eu-conheço-a-alma-das-meninas" de Mila Rondon, treinadora de Americana, e com o olhar "atenção-mulheres-trabalhando" de Macau Ferreira, de Osasco.
Gostei dos nomes das jogadoras e rabisquei na agenda: Tersya (Maranhão), Eliene (Americana), Mayara (do campeão Jundiaí), Janaína (Joinville), Daiane (Americana)... E adorei quando, depois, à beira da quadra, notei virtudes técnicas em cada uma.
Em muitas delas, percebi também a chama de confiança/arrogância que o atleta de ponta importa da infância ("pedra, muro e árvore", né, Tersya?). Fiquei com a impressão de que o Brasil terá seleção competitiva, este ano, no Sul-Americano e no torneio qualificatório para o Mundial.
Na arquibancada, partilhei palmas e lamentos dos pais e mestres que organizam vaquinhas a fim de bancar o passe de ônibus, o caderno escolar, o agasalho e o lanche que mantêm a roda girando.
Soube que os EUA, na mesma semana, aplaudiram Candace Parker, 17, que superou cinco rapazes para ganhar o concurso de enterradas do McDonald's All-American Game, um dos três principais jogos intercolegiais do país. (Que ironia. O presidente da CBB quer porque quer achar uma brasileira que estufe a cesta.)
Mas concluí que até os americanos sairiam estupefatos do Ibirapuera, quando constatassem como o talento abençoa o basquete feminino nacional a despeito da falta de estrutura e horizonte.
Fechei o domingo satisfeito com o campeonato e, melhor, feliz por ter encontrado tanta gente que devota à bola laranja um amor tão grande como o meu. Soprei um beijo para as meninas superpoderosas e voltei para casa.
Lindinha
Caçula de uma família basqueteira, Izabela, 17, foi a cestinha (26,2 pontos) e a melhor no ranking de eficiência. Das 132 garotas, a ala do Bauru, 1,82 m, é quem alcança mais alto: 2,88 m, segundo inédito e oportuno estudo antropométrico, tocado pelo médico Daniel Gentil.
Florzinha
Michelle, plácida do alto de 1,93 m, liderou nos tocos: 3,2 por jogo, pelo Joinville. A irmã do festejado Tiago Splitter tem só 14 anos.
Docinho
Com ginga e força nos quadris, a novata pivô do Grajaú alucinou nos rebotes: 22,2 por jogo. Mas Clarissa, 16, gosta de atletismo, esporte em que brilha ainda mais (dardo e peso). A CBB tem de paparicá-la!
E-mail melk@uol.com.br
Fonte: Folha de São Paulo
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