terça-feira, 10 de dezembro de 2002

Coluna do Melchiades Filho

Está uma maravilha a coluna de basquete do jornalista Melchiades Filho, na Folha de hoje.

Ele sabiamente analisa os motivos do sucesso de Miguel Ângelo da Luz no comando da seleção feminina (1993-1996).

Espero que essa mesma sabedoria esteja presente na decisão da CBB sobre a sucessão nas comissões técnicas masculina e feminina.

Migué

MELCHIADES FILHO
EDITOR DE ESPORTE


A seleção tinha empacado. A desilusão com a má campanha na Olimpíada de Barcelona lançara a comissão técnica na mesma fogueira de vaidades que consumia as jogadoras. O ano de 1993 prometia o fundo do poço.
Encurralada, a Confederação Brasileira agiu. E baixou o queixo do establishment quando formou o novo grupo de trabalho.
Foram resgatados dois veteranos do bronze no Mundial de 1971, até então a maior proeza da história da equipe feminina.
Waldir Pagan Peres, o treinador da seleção 22 anos antes, assumiu como supervisor. Raimundo Nonato, seu ex-assistente técnico, como chefe da delegação.
O primeiro, para cuidar do dia-a-dia, da infra-estrutura dos treinos à divisão dos quartos. O segundo, para acertar a logística nas grandes competições.
Consultores de luxo, experientes administradores de egos, donos de um currículo medalhado, faziam um proveitoso contraponto aos outros integrantes.
Pois, ao preparador físico Hermes Balbino e ao assistente Sérgio Maroneze, juntou-se outro jovem e antenado estudioso do esporte.
Miguel Angelo da Luz ainda engatinhava na profissão. Meses antes, durante um simpósio de treinadores no Rio, chamou a atenção da todo-poderosa técnica Maria Helena Cardoso e, por tabela, da Confederação Brasileira. Era um total desconhecido.
A audácia do presidente Renato Brito Cunha de promovê-lo naquele mesmo ano à seleção principal foi encarada como um desatino. Pelos jornalistas, dirigentes, colegas e, até mesmo, pelas atletas. "Quem é esse Zé Migué?"
Mas a comissão técnica, empíricos e CDFs unidos, "encaixou".
As jogadoras adoraram o clima de liberdade, dentro e fora de quadra. O talento represado aflorou. E os pódios, até então considerados inatingíveis, vieram a galope, já no ano seguinte: a medalha de ouro no Mundial-1994 e a de prata na Olimpíada-1996.
A atual situação do basquete masculino lembra demais a do feminino de dez anos atrás.
Como na década passada, há uma crescente frustração com o desempenho internacional da seleção -ela perdeu a hegemonia continental, deu vexames históricos nos Mundiais e afastou-se, como nunca, do cenário olímpico.
Há novamente um diagnóstico de que o time joga amarrado, coibindo ações individuais -no último Mundial, estéril, bateu o recorde de ataques sem arremesso.
E também há um elenco jovem e talentoso, mas dividido, disperso, alheio à mão-de-ferro do treinador -muitos nomes nem mais atendem às convocações.
Não se espera que Gerasime Bozikis repita os arroubos de seu igualmente polêmico antecessor, até porque os dois cartolas têm "diferenças irreconciliáveis".
O leitor fiel sabe, também, que esta coluna não considerava oportuna a demissão de Hélio Rubens. Defendia que ele fechasse seu ciclo no Pré-Olímpico.
Mas, já que a pancada foi dada, talvez este seja o momento de reviver a ousadia de 1993.
Pode ser o próprio Miguel Angelo. Ou não. Pode ser um colegiado de 1987 (Medalha, Guerrinha, Marcel, Cadum...), credenciado pelo brilho da última grande conquista no masculino. Ou não.
Pode ser muita coisa.
Só não pode ser a saída fácil, a troca de seis por meia dúzia . Até porque, nesse caso, o meia dúzia sempre trabalhou do lado do seis.


Fonte: Folha de São Paulo

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