domingo, 4 de dezembro de 2005

Sem glórias do passado e perspectiva de futuro

Rogério Daflon

Paulão tem 19 anos e mede 2,10m. O pivô tem a juventude e a estatura necessárias para alguém que sonha viver do basquete. Mas realizar este desejo no Rio está cada dia mais complicado. Na quinta-feira, enquanto observava o clássico Flamengo x Vasco nas quase vazias arquibancadas do Municipal, o pivô, que atua pelo Municipal, era só preocupação com seu futuro.

— Com um Campeonato Estadual fraco como este, fica difícil alguém prestar atenção na gente — afirmou Paulão.

Esse clima de “No future” (palavra de ordem do movimento punk na década de 70 na Europa) leva alguns jogadores a dar declarações em tom radical.

— A arbitragem é horrorosa, há quadras sem qualquer condição de jogo. Houve inclusive um dia em que o Grajaú se recusou a jogar no Iguaçu por falta de placar e das péssimas condições do ginásio (a partida acabou sendo remarcada e o Grajaú acabou concordando em jogar três dias depois). Aqui nenhum jogador tem perspectiva de melhorar de vida. Jogo porque gosto de basquete, mas já estou procurando emprego — disse Soel, que formou-se em administração e economia. — Os jogadores que, diferente de mim, não tiveram acesso a estudo estão numa situação difícil.

Inflexível, o ala rubro-negro Alexey sequer entrou em quadra na partida do Flamengo contra o Vasco:

— Só jogo com bota de esparadrapo para evitar novas lesões. Cheguei aqui no Municipal, e ninguém do Flamengo trouxe esparadrapo. Este Estadual está triste. Daqui a pouco, vamos voltar à década de 70, quando os jogadores chegavam de seus trabalhos para jogar e nem pensavam em viver do basquete. Falidos, os clubes de futebol não aproveitam o fato de ter uma imensa torcida para melhorar o esporte amador.

Há quem tenha discurso mais ameno, pontuado pelo tom saudosista.

— Há pouco tempo, vi este mesmo jogo num Maracanãzinho lotado — disse Paulo Chupeta, o técnico do Flamengo.

De fato, a torcida de outrora do clássico entre Flamengo e Vasco era imensa. E não foi mesmo há tanto tempo. No Maracanãzinho, o Vasco, liderado pelo técnico Hélio Rubens, foi campeão com um ótimo time, com jogadores como o americano Charles Byrd, Helinho e Sandro Varejão, entre outros. Do lado rubro-negro, Oscar, o americano Robin Davis, o canadense Greg Newton, Josuel e Ratto desfilavam seu talento. O Maracanãzinho, por sinal, foi palco de outras incríveis finais entre Vasco e Flamengo nas décadas de 70, 80 e 90, com mais de 15 mil pessoas nas arquibancadas.

Neste Estadual, somente o Telemar/Rio de Janeiro teve recursos para montar um bom time. Por isso, é apontado como o mais previsível campeão dos últimos tempos.

Com uma folha mensal em torno de R$ 150 mil, o time, que tem Oscar como gerente, compete com sete equipes em dificuldades financeiras.

O próprio Flamengo, que tem o patrocínio da Petrobras, tem uma folha de pagamentos modesta — algo em torno de R$ 30 mil. Os demais estão à mingua. O outrora poderoso Vasco é recheado de atletas juvenis com outros cinco recentemente promovidos à categoria adulta. Municipal, Grajaú, Iguaçu, Campos e Macaé devem fazer uma disputa à parte pelo quarto lugar.

O clima político que invadiu o esporte leva a Confederação Brasileira de Basquete (CBB), com sede no Rio, a querer ressaltar a agonia do Estadual. A Federação Estadual (Feberj) votou contra a reeleição do presidente da CBB, Gerasime Bozikis, o Grego, e o clima entre as duas entidades é o pior possível. Hoje, o basquete brasileiro é assim. A CBB torce para que o campeonato da Nossa Liga seja um fiasco. A Nossa Liga torce para que o Nacional de Basquete da CBB seja um fracasso.

E todos prosseguem, desunidos, enquanto a modalidade agoniza.

Fonte: O Globo

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