terça-feira, 8 de março de 2005

No Garrafão: Sala Vip

Marcelo Laguna

Estava pronto para iniciar a coluna desta semana com palavras nada elogiosas aos integrantes do site oficial do Hall da Fama do basquete. Mas pelo visto os americanos tiveram um curso rápido de geografia brasileira e arrumaram uma bobagem histórica na página oficial dos indicados deste ano.

Ao contrário do que aparecia até a semana passada, a nossa Hortência Marcari, uma das indicadas na categoria Internacional, surge como nascida em Potirendaba, Brasil até então localizada, pelo site do Hall da Fama em algum ponto distante da Espanha!!

Ignorâncias geográficas à parte, não deixa de ser um orgulho ver o nome de uma brasileira tentando garantir um lugar entre os imortais do basquete. Nunca houve e não haverá mais uma cestinha como Hortência, e isso não é um exagero ufanista. Ao lado da companheira de seleção e grande rival em competições de clubes, Magic Paula, Hortência encantou as quadras por onde atuou e justificou, em diversas ocasiões, o apelido de “Rainha”.

Uma destas vezes em que assombrou o mundo ocorreu em 1983, na decisão da medalha de bronze dos Jogos Pan-Americanos de Caracas, na Venezuela. O Canadá derrotava o Brasil por apenas um ponto, quando faltavam 20 segundos para o final do jogo. Hortência recuperou a bola, driblou duas adversárias e teve o sangue-frio suficiente para fazer o arremesso certeiro que deu a vitória à seleção brasileira e de quebra a medalha de bronze.

O que dizer, então, da atuação da Rainha na estréia no Pan-Americano de Havana/91? O Brasil teria pela frente o temido time dos EUA, que estava invicto há mais de 30 jogos oficiais, campeão olímpico, pan-americano e mundial. Mas com uma atuação soberba de Hortência, as brasileiras passaram pelo time americano por 87 a 84, abrindo caminho para a gloriosa campanha da conquista da medalha de ouro, quando venceu Cuba na final por 97 a 76.

O ponto alto da carreira de Hortência – e por que não dizer do próprio basquete brasileiro – ocorreu na distante Sydney, na Austrália, em 1994. Após sair completamente desacreditada do Brasil, a seleção brasileira fez uma campanha brilhante e chegou ao título mundial, batendo os EUA na semifinal e a seleção da China de decisão. Pela primeira vez na história do basquete o título do Mundial feminino deixava de ficar entre EUA ou Rússia. Foi a última grande conquista do basquete brasileiro e mais uma vez, Hortência teve participação fundamental, sendo escolhida como a melhor jogadora do torneio e terminando também como a principal cestinha (221 pontos).

Só pode ser considerada especial uma jogadora que detém o recorde mundial de pontos marcados numa só partida (121), durante os Jogos Regionais, entre Sorocaba e Socorro, em 1991. Também é de espantar que menos de seis meses depois de ter abandonado o esporte para ser mãe, Hortência tenha retornado às quadras e ajudou a seleção brasileira a conquistar a medalha de prata nas Olimpíadas de Atlanta/96.

Mesmo com todos estes feitos, não dá para garantir que Hortência será indicada para o Hall da Fama no dia 4 de abril, data da divulgação dos indicados. A turma de Springfield, cidade americana onde o memorial está localizado, tem lá seus critérios meios estranhos para permitir a entrada na sala Vip das quadras de basquete. Mas uma coisa é certa: no coração dos basqueteiros brasileiros, Hortência tem lugar cativo e eterno.

No Garrafão:
Marcelo Laguna, 41 anos, é chefe de reportagem da editoria de esportes do Diário de São Paulo. Já cobriu duas Olimpíadas (Atlanta/96 e Sydney/00), dois Pan-Americanos (Mar del Plata/95 e Winnipeg/99) e três Mundiais de Basquete (no masculino, Canadá/94 e Grécia/98, no feminino, Alemanha/98), além de dois Pré-Olímpicos masculinos de basquete (São Paulo/84 e Argentina/95)


Fonte: BasketBrasil

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