(bela) Coluna do Melchiades
Mulheres pintadas
MELCHIADES FILHO
EDITOR DE ESPORTE
Ao contrário do que parece, é o lance mais difícil. Fintar o marcador com um passo, quicar a bola em direção da cesta, brecar antes que a cobertura chegue (e não andar!), saltar alto, às vezes para trás, e acertar o arremesso. Jogo de pernas, drible, reconhecimento de quadra, equilíbrio e chute. Dos fundamentos mais importantes do basquete, só um não está envolvido (o passe).
Foi por dominar tal sequência -e não as enterradas!- que Michael Jordan curvou a NBA.
Foi porque ela faz parte de sua cultura de jogo que o basquete iugoslavo destacou-se na Europa.
E foi com ela que Hortência quebrou um tabu no Brasil -o que, para mim, imortalizou-a como a melhor jogadora do país.
Sempre esfomeada, Hortência balançava o rabo-de-cavalo e "batia para dentro" (com a variante de acelerar para a bandeja em vez de frear para o "jump").
Iluminadas pelo sucesso de sua cestinha, as brasileiras perceberam o que ganhariam se jogassem mais próximas da cesta e abandonaram o "jogo tático", de passes estéreis e tiros telegrafados.
Das costuradas de Paula e da gafieira de Janeth no garrafão, da raça das Hernandez e dos cotovelos de Alessandra, as vitórias saíram, e os pódios apareceram.
Quando essa geração se afastou -e não apareceram novas fagulhas de talento-, o basquete feminino nacional engessou-se, fincou de vez âncora na chamada área pintada. Repare em seus últimos campeões. Quase todos (posso dizer todos?) iniciavam seus ataques perto da tabela.
Anteontem, ao despachar Ourinhos em 3 x 0 no playoff, Americana estendeu a recente tradição.
O oponente cedeu ante a força de Cíntia Tuiú-Ega-Geisa, 1,90 m em média, e perdeu de lavada a disputa dos rebotes (116 x 91).
Do alto, as três trocavam bolas e davam fluxo às iniciativas ofensivas. Responderam por 23 das 65 assistências de Americana no mata-mata (35%). As armadoras, veja só, totalizaram 21 (32%). As jogadoras de força de Ourinhos conseguiram apenas quatro passes perfeitos, 19% da equipe.
As demais campeãs se ajustaram. Adrianinha pôde até arriscar um contra-ataque ou dois. Mas sua função era mesmo executar o "passe de entrada" para o garrafão. A missão de Lilian? Dormir no perímetro à espera do passe das gigantes e acordar nos arremessos de três pontos. A Micaela, ou Kaé, como prefere, coube zanzar na área pintada, aproveitando os bloqueios das pivôs para se desmarcar e bicar a cesta.
Repare que a cartilha é bem semelhante, senão idêntica, à da seleção brasileira. O Mundial do ano passado teve Adrianinha e Tuiú, com Helen, Janeth, Alessandra e Kelly antecipando a lição de Lilian, Kaé, Ega e Geisa.
Não é coincidência. Paulo Bassul, técnico de Americana, assiste Antonio Carlos Barbosa na seleção, numa simbiose que às vezes até confunde o comando tático.
Por isso, no Sul-Americano, em junho, não se surpreenda se a cartilha enviar Adrianinha, Lilian, Kaé, Tuiú e Alessandra (Érika) à quadra -com Silvinha, justamente quando fecha uma década de convocações, no banco.
Feminino 1
Como ocorreu com Ourinhos no Paulista-02 e com Guaru no Brasileiro-02, prevaleceu quem "alugou" mais atletas de ponta -no caso de Americana, Adrianinha e Tuiú. De novo, a mensagem do torneio para os clubes foi: enrole a primeira fase e contrate na reta final.
Feminino 2
Começou ontem o trabalho da seleção sub-21 para o Mundial da Croácia. Até nisso, Americana goleou. Além de Bassul, cedeu quatro convocadas, contra duas do vice. Os treinos serão em... Americana!
Feminino 3
Preocupante, para a seleção principal e para a sub-21, a falta de ritmo de jogo de Érika, pivô que sabidamente não gosta de treinar.
E-mail melk@uol.com.br
Fonte: Folha
Mulheres pintadas
MELCHIADES FILHO
EDITOR DE ESPORTE
Ao contrário do que parece, é o lance mais difícil. Fintar o marcador com um passo, quicar a bola em direção da cesta, brecar antes que a cobertura chegue (e não andar!), saltar alto, às vezes para trás, e acertar o arremesso. Jogo de pernas, drible, reconhecimento de quadra, equilíbrio e chute. Dos fundamentos mais importantes do basquete, só um não está envolvido (o passe).
Foi por dominar tal sequência -e não as enterradas!- que Michael Jordan curvou a NBA.
Foi porque ela faz parte de sua cultura de jogo que o basquete iugoslavo destacou-se na Europa.
E foi com ela que Hortência quebrou um tabu no Brasil -o que, para mim, imortalizou-a como a melhor jogadora do país.
Sempre esfomeada, Hortência balançava o rabo-de-cavalo e "batia para dentro" (com a variante de acelerar para a bandeja em vez de frear para o "jump").
Iluminadas pelo sucesso de sua cestinha, as brasileiras perceberam o que ganhariam se jogassem mais próximas da cesta e abandonaram o "jogo tático", de passes estéreis e tiros telegrafados.
Das costuradas de Paula e da gafieira de Janeth no garrafão, da raça das Hernandez e dos cotovelos de Alessandra, as vitórias saíram, e os pódios apareceram.
Quando essa geração se afastou -e não apareceram novas fagulhas de talento-, o basquete feminino nacional engessou-se, fincou de vez âncora na chamada área pintada. Repare em seus últimos campeões. Quase todos (posso dizer todos?) iniciavam seus ataques perto da tabela.
Anteontem, ao despachar Ourinhos em 3 x 0 no playoff, Americana estendeu a recente tradição.
O oponente cedeu ante a força de Cíntia Tuiú-Ega-Geisa, 1,90 m em média, e perdeu de lavada a disputa dos rebotes (116 x 91).
Do alto, as três trocavam bolas e davam fluxo às iniciativas ofensivas. Responderam por 23 das 65 assistências de Americana no mata-mata (35%). As armadoras, veja só, totalizaram 21 (32%). As jogadoras de força de Ourinhos conseguiram apenas quatro passes perfeitos, 19% da equipe.
As demais campeãs se ajustaram. Adrianinha pôde até arriscar um contra-ataque ou dois. Mas sua função era mesmo executar o "passe de entrada" para o garrafão. A missão de Lilian? Dormir no perímetro à espera do passe das gigantes e acordar nos arremessos de três pontos. A Micaela, ou Kaé, como prefere, coube zanzar na área pintada, aproveitando os bloqueios das pivôs para se desmarcar e bicar a cesta.
Repare que a cartilha é bem semelhante, senão idêntica, à da seleção brasileira. O Mundial do ano passado teve Adrianinha e Tuiú, com Helen, Janeth, Alessandra e Kelly antecipando a lição de Lilian, Kaé, Ega e Geisa.
Não é coincidência. Paulo Bassul, técnico de Americana, assiste Antonio Carlos Barbosa na seleção, numa simbiose que às vezes até confunde o comando tático.
Por isso, no Sul-Americano, em junho, não se surpreenda se a cartilha enviar Adrianinha, Lilian, Kaé, Tuiú e Alessandra (Érika) à quadra -com Silvinha, justamente quando fecha uma década de convocações, no banco.
Feminino 1
Como ocorreu com Ourinhos no Paulista-02 e com Guaru no Brasileiro-02, prevaleceu quem "alugou" mais atletas de ponta -no caso de Americana, Adrianinha e Tuiú. De novo, a mensagem do torneio para os clubes foi: enrole a primeira fase e contrate na reta final.
Feminino 2
Começou ontem o trabalho da seleção sub-21 para o Mundial da Croácia. Até nisso, Americana goleou. Além de Bassul, cedeu quatro convocadas, contra duas do vice. Os treinos serão em... Americana!
Feminino 3
Preocupante, para a seleção principal e para a sub-21, a falta de ritmo de jogo de Érika, pivô que sabidamente não gosta de treinar.
E-mail melk@uol.com.br
Fonte: Folha
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