Peço desculpas a quem não gosta, mas pareço estar entrando numa fase “revisionista”, já que o presente do basquete feminino me decepciona e me interessa pouco. Estou focado em registrar o passado (esquecido por muitos e ignorado por outros) e em observar novos talentos que possam construir um futuro mais interessante para a modalidade. Então, paciência porque está vindo muita ‘velharia’ por aí…
Anteontem reproduzi uma reportagem de 1984 (Magic Paula na Minercal) aqui no blog e estava à procura de respostas sobre um momento do basquete que eu não vivi.
Com ajuda da Wilkipedia (confira o link aqui), descobri que aquela edição do Sul-Americano de Clubes foi vencida pela Prudentina, de Hortência.
A informação me foi confirmada pelo técnico Antônio Carlos Vendramini, técnico da equipe campeã. Diz ele:
“Em 84, a Paula reforçou a Minercal para o Sul-Americano, sediado em Sorocaba. Vencemos com a Prudentina e de Sorocaba fomos direto (de ônibus) para Porto Alegre, onde vencemos a Copa Brasil.”
O técnico da equipe da Minercal era Waldyr Pagan e Sérgio Maroneze era seu assistente.
Novamente o Renato me surpreendeu com outro documento inusitado. Trata-se de um registro da história da Prudentina no basquete, redigido no calor do momento da saída de Hortência do time, em que os dirigentes destilam toda a sua mágoa com a cestinha:
Uma história de glórias
O tablóide especial resume assim a trajetória da Prudentina, nos 61 anos de fundação: "O que era apenas uma equipe de basquete masculino tornou-se o maior clube esportivo do Estado de São Paulo. A Apea nasceu em 1936, e 26 de outubro daquele ano, foi seu primeiro dia de vida. Depois disso, o clube foi crescendo e acumulando títulos conseguidos em diversas competições. Mantendo sempre uma equipe de basquete, o clube foi campeão de uma série de jogos ao longo desses 61 anos. Se fossem juntadas todas as equipes que passaram pela Apea durante esse tem po, estariam reunidas as maiores estrelas do esporte no país e até algumas internacionais.
Fizeram parte da equipe de basquete da Apea, jogadoras como Hortência, Tuty, Solange, Jussara e até a norte-americana Beverly. O clube foi o primeiro a trazer uma estrangeira para jogar no país.
Em 1985, a extinção do basquetebol
Como foi explicado, o basquete se destacava entre as modalidades esportivas da Prudentina. A escolinha que já dava os primeiros passos em 1936, ganhou ascensão, depois desapareceu, para voltar com expressiva estrutura em 1982. A equipe feminina despontava, tornou-se muito competitiva e nesse ano, consagrou-se ao vencer o campeonato paulista.
Foi campeã desse certame também em 1983. Foi ainda em 1983, que o time recebeu força total, com as contratações de Hortência e da norte-americana Beverly. O time venceu os campeonatos Sul-Americano de Basquetebol de 1983 e 1984. Em 84, conquistou mais o Troféu Imprensa. Paralelamente, ganhou os jogos regionais e abertos de 1982, 1983 e 1984.
A consagração definitiva e com reconhecimento em todo o mundo, veio em junho de 1984. A Prudentina foi vice-campeã da Copa W. Jones, realizada em Taipé, China. O primeiro lugar ficou com a Seleção Olímpica, dos Estados Unidos. O terceiro com a Seleção da Itália. O quarto lugar, com a Seleção do Canadá.
Só a equipe da Prudentina era de um clube social. As demais vencedoras, eram seleções de seus países. Formação básica da Apea: Hortência, Beverly, Solange, Neca, Rosemary, Vanira, Cristina, Vânia, Eronides e Fátima. Técnico, Antônio Carlos Vendramini. Dirigente, Antônio de Figueiredo Feitosa. Chefe da delegação que foi a Taipé, Antônio Martinho Fernandes. Médico, Ramon Canno Garcia.
Projeção máxima da Apea e de Presidente Prudente, decorrente de um basquetebol extraordinário. O que, entretanto, não duraria muito, a partir daquela célebre ascensão do basquetebol. Transformadas em mitos, algumas atletas começaram a interessar a outras equipes e Hortência, tratada como rainha no clube e na cidade, foi a primeira a tornar-se dissidente. Passou a exigir dinheiro em excesso, diante das propostas recebidas, por exemplo, da Minercal, de Sorocaba.
Na reunião da diretoria, em março de 1985, o começo do drama. Antônio Martinho Fernandes telefonou de São paulo, para onde tinha viajado junto com Antônio Macca, informando que segundo Hortência, ela havia recebido da Minercal, proposta de assinatura de um contrato de Cr$ 100 milhões de luvas e Cr$ 10 milhões por mês. Somente por valores iguais, continuaria jogando na Prudentina.
Martinho (Nico) se mostrava aborrecido, porque Hortência se comprometera a aguardar até 10 de abril, data em que a futura diretoria da Apea seria empossada e decidiria as normas do novo contrato. Mas Hortência se antecipou aos fatos, sem levar em conta o tratamento dado a ela em Presidente Prudente, incluindo o favorecimento da compra de um automóvel a preço de custo e com o número 4 na placa, conforme exigência da atleta.
Os dois enviados da Prudentina a São Paulo, oferceram a Hortência, luvas de Cr$ 50 milhões e salário mensal de Cr$ 8,5 milhões. Ela achou pouco. A diretoria executiva liderada por Aloysio Dias Campos, considerava impossível concordar com a proposta da jogadora, que deveria ser no mínimo igual a da Minercal, da cidade de Sorocaba. Ainda porque os gastos com o último campeonato, se aproximaram dos Cr$ 70 milhões, recursos obtidos extra-clube, ou seja, com a ajuda do comércio, indústria e outros segmentos de Presidente Prudente.
Feliciano Ribeiro, que substituiria Aloysio Dias Campos na presidência da Apea, a partir de 10 de abril, opinava que somente com um grande time, o clube deveria participar de outros certames oficiais. O assunto voltou a ser tratado em nova assembléia, dia 9 de março de 1985, pelos diretores Adalberto Lopes Pereira, Antônio
de Figueiredo Feitosa, Antônio Martinho Fernandes, Antônio Plácido Pereira, Armando
Ruiz, Deodato da Silva, Faradei Bôscoli, Laert Bueno Júnior, Laudério Leonardo Botigelli, Luiz Reina, Paulo Alberto Martinez, Pedro de Almeida Nogueira, Casemiro Acilon de Alencar, Antônio Macca, Aloysio Dias Campos (que presidiu a reunião), e o futuro presidente, Feliciano Ribeiro.
Aloysio logo disse entender que não seria lícito renovar o contrato de Hortência, à sua maneira, e deixar a dívida para a diretoria seguinte. Na sequência das discussões Hortência-Minercal, ficou acertado que a atleta ganharia Cr$ 100 milhões de luvas, Cr$ 10 milhões de salários nos primeiros seis meses do contrato e após esse período, Cr$ 15 milhões por mês, não aceitando os Cr$ 50 milhões de luvas e Cr$ 8,5 milhões mensais oferecidos pela Prudentina. Deixaria a equipe que a consagrou. Jogar em Sorocaba tinha mais um sabor para Hortência. Estaria próxima do atleta Maurício, do voleibol da Pirelli, com quem pensava casar-se.
Na mesma assembléia, Antônio de Figueiredo Feitosa contou que havia feito as primeiras tentativas de entendimento com Hortência, frustrou-se e transferiu a missão para os colegas de diretoria, Antônio Martinho Fernandes e Antônio Macca.
A atleta continuou irredutível, frente ainda a propostas ouvidas das equipes do Santa Maria, de São Bernardo do Campo e da Pirelli, de São Caetano do Sul, todas elas vantajosas, mesmo não chegando ao nível da Minercal. O diretor Laudério Leonardo Botigelli chegou a sugerir pagar salário de Cr$ 20 a Cr$ 25 milhões a jogadora, através de patrocínios e compatibilidade de caixa, dispensando-se as luvas. Só que isso se consolidaria, se Hortência comparecesse à Prudentina até quarta-feira da semana seguinte, o que lhe foi comunicado por meio de carta com aviso de recebimento. Ao ser empossado na presidência da Apea, Feliciano Ribeiro encontrou o impasse sem solução, porém uma imensa vontade de resolvê-lo. E não houve saída diferente. A equipe continuou jogando basquetebol, inclusive com participação da norte-americana Beverly.
Sobreviveu até aquele ano de 1985, o da dissidência irredutível de Hortência, que a Prudentina transformou em "rainha". As atenções maiores ficaram com a parte social e o clube registrou novas fases de crescimento, continuando a projetar-se além das fronteiras do país.