Há cinco anos a armadora Claudinha não vestia a camisa verde-amarela. Em 2002, ela despediu-se da seleção brasileira feminina após o Mundial na China e concentrou sua carreira no basquete internacional. Já com vivência de WNBA, defendendo o Detroit Shock e o Miami Sol, ela mudou seu rumo para a Europa e só voltou a jogar no país no ano passado. Depois de dizer não à equipe nacional na convocação para o Mundial de 2006, ela decidiu retornar ao grupo em sua nova fase.
De motivação renovada pela profunda transformação na seleção (nenhuma das jogadoras da época de sua primeira passagem permanece e inclusive o técnico é outro), Claudinha assume a responsabilidade de ser a ‘veterana’ do grupo. “Meu papel é este, passar tranqüilidade, passar experiência”. Dona de uma medalha olímpica de bronze (Sydney-2000), ela sonha em aumentar sua coleção e segue motivada para a primeira tentativa de classificação da equipe: o Pré-olímpico das Américas, no Chile, a partir da próxima quarta-feira.
Com a responsabilidade de comandar a armação nacional em Valdívia, Claudinha não se preocupa com o anunciado retorno da até então titular da vaga, Adrianinha, na próxima temporada. “Não vim aqui para competir com a Adrianinha”, garante. O que a motiva, assegura, é o sonho de disputar mais uma Olimpíada. “Outra medalha é o que mais desejo”, confessa.
O caminho até lá é longo e começa com grande dificuldade. No Chile, a seleção brasileira enfrentará os Estados Unidos com força máxima na luta pela vaga única em disputa. Se não conseguir desta vez, ainda tem mais uma chance, o Pré-olímpico Mundial no ano que vem. Para chegar lá, precisa disputar a semifinal. Mas nem mesmo a lembrança da surra levada pela seleção no último confronto contra as norte-americanas diminui a esperança da jogadora de resolver o assunto ainda na América do Sul. “Cada jogo é um jogo. O que não podemos é criar o monstro”. Lamento mesmo só pela chance perdida pelo país de estimular a modalidade após a conquista da medalha olímpica. “Ficamos em standby”.
Por Marta TeixeiraGE.Net: Por que você decidiu deixar a seleção?
Claudinha: Na época eu jogava demais. Jogava no Brasil, na WNBA e na seleção. Foi assim durante quatro anos e eu estava muito cansada. Além disso, já não tinha motivação para atuar na seleção.
GE.Net: Houve algum problema com o grupo, com o técnico (na época, a seleção era comandada por Antonio Carlos Barbosa)?
Claudinha: Não. Foram razões pessoais. Eu estava cansada, não estava a fim, não tinha vontade de viajar, de ficar concentrada. Eu não estava 100%. Mas não houve problema nenhum com o grupo ou com ninguém, até porque seria difícil voltar se tivesse acontecido isso.
GE.Net: Você ficou cinco anos longe e agora decidiu voltar. Por quê?
Claudinha: Eu recebi o convite do Paulinho (Bassul) e gosto muito dele. Além disso, tem a possibilidade de disputar mais uma Olimpíada que é algo muito especial para qualquer um.
GE.Net: Na temporada passada (para o Mundial, em São Paulo), você também foi convocada...
Claudinha: Da outra vez não fiquei, nem me apresentei. Conversei com a Confederação e pedi dispensa.
GE.Net: Quais suas novas metas com a seleção?
Claudinha: Primeiro, classificar para as Olimpíadas o mais rápido possível, mas outra medalha é o que mais desejo. Não é porque tenho uma que não vou querer outra.
GE.Net: É mais difícil voltar à seleção agora ou foi entrar na primeira vez?
Claudinha: Agora. Quando comecei era... começo, vim com muita ansiedade, mas era tudo mais leve. Mas agora a situação é de ajudar efetivamente o grupo, a responsabilidade é maior.
GE.Net: Você se une à equipe em uma fase completamente diferente. Quando saiu, a base era de jogadoras experientes, titulares consagradas. Agora, você encontra um time jovem e bastante renovado...
Claudinha: Um dos motivos de eu ter voltado foi esse. Nós temos muitas meninas que jogam na Europa, mas que não têm tanta experiência na seleção, o que é muito diferente. Meu papel aqui é este, passar tranqüilidade, passar experiência.
Foto: Marcelo Ferrelli/Gazeta Press
Ao lado de Iziane, Claudinha espera que sua experiência possa ajudar novatas neste novo ciclo da seleção feminina
GE.Net: Enquanto esteve longe da seleção, você jogou muito tempo na Europa. Como esta experiência mudou o seu estilo de jogar?
Claudinha: Aprendi a jogar com menos afobação. Quando o jogador corre mais que a bola, acaba prejudicando o time (risos). Na Europa, as armadoras não pontuam muito e tive que me adaptar. Acho que foi isso o mais importante, esta paciência, o controle do ego. Aqui, as equipes querem que você pontue o máximo. Lá, elas querem os pontos, mas dentro das características de estilo do jogo.
GE.Net: E como foi se adaptar a um estilo tão diferente do seu?
Claudinha: Foi difícil. Saí daqui com 26-27 anos. Não foi fácil, só quando jogava de 2 (ala/armadora), me soltava. Mas o ritmo hoje em dia é este. Não adianta mais correr, este estilo só funciona com os Estados Unidos no masculino. Você tem de jogar mais compassado, mas claro que deve correr quando pode.
GE.Net: E de que maneira pretende ajudar a seleção com este aprendizado?
Claudinha: Eu tenho que encontrar a jogadora na melhor posição, saber onde elas se sentem mais confortáveis. Não adianta colocar uma jogadora de força para correr...
GE.Net: Você participou de todo o ciclo anterior, quais as diferenças nestas duas fases. Como você define a seleção hoje?
Claudinha: Com certeza, a força desta equipe é o conjunto. Claro que temos a Iziane, uma jogadora da WNBA, mas o fundamental é o grupo. Estas meninas são muito disciplinadas, escutam muito a gente, o Paulinho. É um time que ainda precisa trabalhar em cima, lapidar, mas temos que acreditar no comando. O Paulinho dá liberdade, mas tem um perfil que ele deseja e todo mundo acredita.
GE.Net: Passando por toda esta reformulação, vocês seguem para o Pré-olímpico que tem apenas uma vaga para Pequim. Não vai ser fácil...
Claudinha: Sabemos que é difícil. Os Estados Unidos têm uma equipe individualmente muito boa, mas que nunca pode treinar o conjunto. O que queremos é fazer final, porque nela tudo é possível. Podemos fazer um bom jogo em um mau dia para elas e conseguir vencer...
GE.Net: Enfrentar os Estados Unidos depois da experiência no Mundial de 2006 não vai ser fácil. É preciso antes expurgar aquela lembrança? (No Mundial, o Brasil perdeu por 99 a 59, a maior diferença histórica de placar na competição).
Claudinha: Aquele jogo deixou todo mundo com a impressão: será que é imbatível? Mas cada jogo é um jogo. O resultado foi péssimo mesmo, a gente assume. Eu não estava lá, mas é a seleção, é todo mundo. O que não podemos é criar o monstro, porque aí é mais difícil. Elas também perdem, tanto que perderam da Rússia. (Os EUA) São uma potência individual, mas como conjunto não sei se são as melhores do mundo.
GE.Net: A juventude pode complicar a situação do Brasil?
Claudinha: Pode comprometer, mas também pode ajudar. Elas são mais destemidas. Já vimos aluno ganhar do mestre antes. Isso pode interferir, é correr um risco, mas também pode ajudar.
GE.Net: E depois do Pré-olímpico, o que você já tem programado?
Claudinha: Volto para a França, porque já assinei com o Clermont Ferrand.
GE.Net: Você já jogou na França antes (Lattes Maurin Montpellier), como é o basquete francês?
Claudinha: É muito metódico, você tem que cadenciar bastante e a armadora tem que comandar mesmo. Aqui nem tanto. Mas eu não vim aqui para cadenciar nada (risos). Só que a gente não pode ser doida. Jogo da seleção é diferente, tudo que em um clube passa batido, aparece aqui.
GE.Net: Você se sente titular nesta seleção? A volta da Adrianinha te preocupa (a armadora pediu dispensa do restante desta temporada por problemas particulares, mas garantiu ao técnico que retorna à equipe no próximo ano).
Claudinha: Eu não me sinto titular. Não vim aqui para competir com a Adrianinha, o que fizer será pela seleção. Esta resposta só quem pode dar é o Paulinho. Titular todo mundo quer ser, mas se for para diminuir minutos e atingir os objetivos, quem vai se preocupar se é titular ou não? O Paulinho vai saber decidir.
GE.Net: São quase dez anos só de seleção, qual sua melhor recordação no basquete?
Claudinha: A medalha olímpica (bronze em Sydney-2000)! Foi demais porque a gente começou mal, não tinha grande pressão e tiramos a Rússia na semi. Eu fui titular e ganhamos a medalha, com certeza é minha melhor lembrança.
GE.Net: Foram anos fora do Brasil, como você vê as mudanças do basquete no país neste meio tempo? Muitas jogadoras foram para o exterior...
Claudinha: Acho que o nível até não caiu muito, mas o basquete também não evoluiu muito. Não é a mesma coisa de 6-7 anos, mas quem ficou não deixou a peteca cair. Neste período fomos quarto na Grécia e no Mundial... Mas acho que ficamos em standby, se tivéssemos investido mais... Ao invés de melhorar, as jogadoras foram saindo. Foi uma pena, mas mesmo assim as que ficaram conseguiram se manter entre as melhores do mundo. Todas têm um valor.
Fonte: Gazeta Esportiva